Comprei meu primeiro disco de rock neste ano. Passava, como de costume, as férias de fim de ano em União da Vitória. A cidade pode ser muito fria em julho. Em dezembro, entretanto, faz um calor do cacete. Todas as viagens para lá eram especiais. Eram grandes aventuras. Essa foi inesquecível. Fomos de ônibus – Estrela Azul. No meio do percurso – que pra mim durava dias – meu irmão mais velho me chamou:
_ ô cara venha ver isso aqui, mas não fale pra ninguém...
e então ele me mostrou um troço que ia mudar a minha vida. Era um teste, destes que as revistas femininas fazem, em que você vai marcando as respostas e depois soma os pontos chegando a um conclusivo resultado. Acontece que não era nehuma revista feminina. Era o Chiclete com Banana.
O tal teste, creio que na página do meio, tinha o seguinte título “Você é um escroto?” e era ilustrado por uma benga com cara de gente. Ficamos lendo as perguntas e nos próximos cinco anos vindouros foi a coisa mais engraçada que eu enfrentei. No final você era chamado de viado, entre outras coisas, e convidado a limpar a bunda com aquela página. A Revista toda era um tesão. Cada vez que eu e meus irmãos comprávamos uma, nós esgotávamos as possibilidades. Líamos e relíamos e rolávamos de rir, e aprendemos tudo o que nos é mais caro até hoje: a sacanagem, a malandragem, literatura de rapaz, a boa música... E sempre, esperávamos ansiosos, arrepiados o próximo número do gibi.
Neste mesmo ano se passaram outras grandes transformações na minha vida. Os tais ritos de passagem. Primeiro, no eco do Rock in Rio, éramos todos metaleiros. Do alto dos meus oito anos, sempre através dos meus irmãos lia e ouvia tudo o que fosse a respeito ao AC/DC ou ao Ozzy. Eu queria ser o Ozzy Osbourne – queria ser gordo, beberrão e filho do capeta. Gordo eu era.
Mas mesmo gordo, eu queria ser goleiro do atlético. Atlético que havia se mudado pro Pinheirão. Na época era um gramado com duas traves (uma em cada extremo), afundado num buraco, cercado por barrancos e do lado da roda gigante - numa cidade vizinha à Curitiba. Mas o Atlético foi pra lá, no ar havia uma esperança e a certeza de que era uma boa idéia. Foram colocados bancos de madeira e excelentes refletores. A seleção foi jogar lá e a gente foi ver. Hoje ninguém mais fala que foi neste dia que o Zico agravou sua contusão. Comecei a ir sozinho e de ônibus aos jogos (sozinho não, com meu irmão). Aquilo sim era ser fodão. Eu contava na escola e os caras não acreditavam.
Vieram às férias de julho e os três irmãos descobriram o grande tesouro, mocado no armário da minha oma. Aquela coleção da História da MPB. Com fascículos encartados trazendo longos textos, muitas fotos, explicações sobre as gravações, fichas técnicas, as letras das músicas. No marsúpio vinha dormindo um pequeno disco. Quatro ou cinco faixas para cada lado. Eram gravações muito antigas, eu não entendi muito bem a principio. Até que as tentativas chegaram em dois nomes : Tom Jobim e Jorge Ben. Deu-se, então, o inesperado. Mas que nada e Chega de Saudade, as respectivas primeiras faixas de cada lado A. Apareceu pra mim o Brasil. Já era fã da seleção e dos Demônios da Garoa. Comecei a entender melhor o que era esse negócio.
Passados mais alguns meses foi a vez de comprar um disco. Nunca tinha comprado um. Quem tem irmãos mais velhos sabe como é. Você vai herdando tudo. Entretanto eu sentia que já era a hora. Fui extorquir o meu pai. Grande sujeito; boa praça e mão aberta. Expliquei –lhe a situação e ele pingou os cruzados necessários. Irmanamente, cada um dos brothers com a mesma soma descemos a rua Matos Costa no mais irrespirável calor. Eu tinha uma camiseta cinza, sem manga, com uma serigrafia do Angus Young que me dava super-poderes. Descemos umas quadras e viramos na Professor Cleto . Ali se situava o “Ponto Real”. Formidável estabelecimento. Misto de banca de jornal, armarinho, banca do bicho, doceria, locadora de vídeo (muitos piratas – VHS e Beta) e loja de discos.
Mexer naquela pilha de Lps, com o dinheiro no bolso, foi a grande emoção daquele ano bom. Robson, meu irmão mais velho teve um momento de rara felicidade. Escolheu o disco do Camisa de Vênus – ao vivo em Santos sem as faixas censuradas. O disco mais executado do verão. Meu outro irmão Luciano, já revelando todos os traços lascivos de sua personalidade ficou com o disco do Lobão. A capa ainda hoje é sensacional. Traz a foto da mulher do cara na época Daniele Daumerie pelada. Branquinha, com seus pequenos peitinhos . O Lobão do lado vestido de padre. Inesquecível
Eu escolhi “O concreto já rachou” da Plebe Rude. Pela capa (eram os caras de suspensórios e cabelo espetado fazendo cara de mau), por já ter escutado na rádio o grande hit e por uma musica chamada “sexo e karatê”. Foi levando, cuidadoso-orgulhoso, o meu embrulho meio sagrado. Lendo certa vez uma biografia do Fellini, recordo que ele disse que a primeira mulher é uma coisa tão importante que o cara tem que se lembrar de, pelo menos, umas quatro primeiras vezes. De Fato, pode não ter sido, o primeiro de todos os discos. Mas dá pra lembrar exatamente, dá pra sentir o cheiro destas coisas todas. As coisas que existiam no tempo em que tudo para nós era primeiro.
em honra àquela estranha noite que não houve com a DJ
_ ô cara venha ver isso aqui, mas não fale pra ninguém...
e então ele me mostrou um troço que ia mudar a minha vida. Era um teste, destes que as revistas femininas fazem, em que você vai marcando as respostas e depois soma os pontos chegando a um conclusivo resultado. Acontece que não era nehuma revista feminina. Era o Chiclete com Banana.
O tal teste, creio que na página do meio, tinha o seguinte título “Você é um escroto?” e era ilustrado por uma benga com cara de gente. Ficamos lendo as perguntas e nos próximos cinco anos vindouros foi a coisa mais engraçada que eu enfrentei. No final você era chamado de viado, entre outras coisas, e convidado a limpar a bunda com aquela página. A Revista toda era um tesão. Cada vez que eu e meus irmãos comprávamos uma, nós esgotávamos as possibilidades. Líamos e relíamos e rolávamos de rir, e aprendemos tudo o que nos é mais caro até hoje: a sacanagem, a malandragem, literatura de rapaz, a boa música... E sempre, esperávamos ansiosos, arrepiados o próximo número do gibi.
Neste mesmo ano se passaram outras grandes transformações na minha vida. Os tais ritos de passagem. Primeiro, no eco do Rock in Rio, éramos todos metaleiros. Do alto dos meus oito anos, sempre através dos meus irmãos lia e ouvia tudo o que fosse a respeito ao AC/DC ou ao Ozzy. Eu queria ser o Ozzy Osbourne – queria ser gordo, beberrão e filho do capeta. Gordo eu era.
Mas mesmo gordo, eu queria ser goleiro do atlético. Atlético que havia se mudado pro Pinheirão. Na época era um gramado com duas traves (uma em cada extremo), afundado num buraco, cercado por barrancos e do lado da roda gigante - numa cidade vizinha à Curitiba. Mas o Atlético foi pra lá, no ar havia uma esperança e a certeza de que era uma boa idéia. Foram colocados bancos de madeira e excelentes refletores. A seleção foi jogar lá e a gente foi ver. Hoje ninguém mais fala que foi neste dia que o Zico agravou sua contusão. Comecei a ir sozinho e de ônibus aos jogos (sozinho não, com meu irmão). Aquilo sim era ser fodão. Eu contava na escola e os caras não acreditavam.

Vieram às férias de julho e os três irmãos descobriram o grande tesouro, mocado no armário da minha oma. Aquela coleção da História da MPB. Com fascículos encartados trazendo longos textos, muitas fotos, explicações sobre as gravações, fichas técnicas, as letras das músicas. No marsúpio vinha dormindo um pequeno disco. Quatro ou cinco faixas para cada lado. Eram gravações muito antigas, eu não entendi muito bem a principio. Até que as tentativas chegaram em dois nomes : Tom Jobim e Jorge Ben. Deu-se, então, o inesperado. Mas que nada e Chega de Saudade, as respectivas primeiras faixas de cada lado A. Apareceu pra mim o Brasil. Já era fã da seleção e dos Demônios da Garoa. Comecei a entender melhor o que era esse negócio.
Passados mais alguns meses foi a vez de comprar um disco. Nunca tinha comprado um. Quem tem irmãos mais velhos sabe como é. Você vai herdando tudo. Entretanto eu sentia que já era a hora. Fui extorquir o meu pai. Grande sujeito; boa praça e mão aberta. Expliquei –lhe a situação e ele pingou os cruzados necessários. Irmanamente, cada um dos brothers com a mesma soma descemos a rua Matos Costa no mais irrespirável calor. Eu tinha uma camiseta cinza, sem manga, com uma serigrafia do Angus Young que me dava super-poderes. Descemos umas quadras e viramos na Professor Cleto . Ali se situava o “Ponto Real”. Formidável estabelecimento. Misto de banca de jornal, armarinho, banca do bicho, doceria, locadora de vídeo (muitos piratas – VHS e Beta) e loja de discos.

Eu escolhi “O concreto já rachou” da Plebe Rude. Pela capa (eram os caras de suspensórios e cabelo espetado fazendo cara de mau), por já ter escutado na rádio o grande hit e por uma musica chamada “sexo e karatê”. Foi levando, cuidadoso-orgulhoso, o meu embrulho meio sagrado. Lendo certa vez uma biografia do Fellini, recordo que ele disse que a primeira mulher é uma coisa tão importante que o cara tem que se lembrar de, pelo menos, umas quatro primeiras vezes. De Fato, pode não ter sido, o primeiro de todos os discos. Mas dá pra lembrar exatamente, dá pra sentir o cheiro destas coisas todas. As coisas que existiam no tempo em que tudo para nós era primeiro.
em honra àquela estranha noite que não houve com a DJ
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